Wednesday, November 15, 2006

Tem mas não há.

Imaginem a seguinte cena: um calor arrasador, as ruas empoeiradas pela falta de asfalto e um calor daqueles de verão, o mais quente que vocês já passaram em suas vidas. Sem vento. O cabelo que acabou de sair do banho todo embaraçado.
Pensem agora numa coca-cola. Geladinha. Cai perfeitamente não? Parece ate um roteiro de propaganda (aprendi a fazer isso aqui. Excelente, mais um task para meu curriculum).
Pois e. Isso realmente aconteceu. Saindo de um dia repleto de ensaios fotográficos paramos num boteco para tomar um refrigerante. Perguntamos educadamente para o moco que guarda os carros se havia vaga naquele local. Ele respondeu-nos: “Tem, mas não há. Podem parar em qualquer lugar. A rua parecia um quebra-cabeça cheio de carros encaixados. Paramos ali mesmo, afinal fomos apenas comprar uma coca-cola. Chegamos no caixa do bar e pedimos o que queríamos. Eu quis pagar em dólar, normal aqui em qualquer lugar. Na hora de me dar o troco pedi que fosse em dólar também e a resposta que recebi: Tem mas não há. Pode ser em kwanza? Claro que sim. Apesar do cambio ser mais alto, valia a pena já estava lá e a vontade de uma bebida “fresca” (gelada) era mais forte. Próximo passo, balcão. Pedi a coca-cola e não tive outra reação a não ser rir da situação. Foram quase 10 minutos ate alguém nos atender. Quando passou uma das 3 mocas que arrumavam as xícaras de café na cafeteira (sim, tinham 3 para fazer isso) perguntei se não tinha alguém que pudesse nos atender. Ela, muito cavalarmente respondeu: Sim senhora, tem mas não há. Somos apenas 3 para arrumar todas as chávenas (xícaras). Depois de muita insistência consegui a coca e o que veio? Uma American Cola. Uma espécie de SchinCola piorada. Fiquei puta mas esperava receber essa mesma resposta-padrão se perguntasse cadê a coca-cola. E não deu outra: tem mas não há. Esse deveria ser o lema da Republica de Angola. Internet aqui, tem mas não há o dia todo, luz de vez em quando não há. Água e serviço de telemovel tem, mas alguns dias.... já sabem.
Na volta desta aventura, conversando com o nosso motorista Joaquim ele estava me explicando mais ou menos como as coisas funcionam aqui quanto a produtos comercializáveis. A maioria das coisas não perecíveis vem de navio para Luanda. Muitas delas demoram meses, então, quando os contentores chegam (ou containers) o produto e distribuído entre os supermercados e rapidamente vão embora. Isso quando os chineses não entram na fila dos navios para comprar, sabe-se Deus como conseguem, todo o carregamento para a sua colônia. Chegamos ao ponto de saber que houve corrida final de semana passado atrás de farinha de mandioca e guaranás brasileiros no Mundo Verde (supermercado que mais tem produtos brasileiros aqui) quando o carregamento chegou. Isso sem falar que os chocolates que chegaram no porto nem chegaram a sair de lá para os supermercados. Parece ridículo, mas compramos copos com os vendedores da Samba (avenida que tem um comercio ilegal no meio dos carros incrível) e ainda não temos uma lixeira de banheiro em casa. Não tem onde comprar essas coisas. Alias, tem mas não há.Acaba sendo uma diversão agora, mas acho que com o tempo ou a gente acostuma a essas coisas ou pira. Aprende a gostar da American Cola, da farinha com pedras (exagero também. Só porque não são tão fininhas) e do pão de sovaco (que são vendidos pelas angolanas que andam pela cidade toda debaixo de um sol de 40 graus,com uma bacia deles na cabeça). O bom e que sempre vamos achar que são frescos porque estão sempre quentinhos. Já disse para Joaquim: compre pão, mas não me diga de onde vem. Se não tiver jeito não compre e justifique: tem mas não há.

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